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domingo, 20 de maio de 2012

JAMES GANG - walk away


FITA CASSETE





Além de o vinil ser uma grande viagem, com aquelas capas alucinadas, que não saem da memória nunca, gravar uma fita cassete com o som dessas bolachonas tinha a magia e os mistérios da escolha das músicas, do estilo e do encadeamento. Existia programação para tudo, desde o registro simples e direto, deixando o disco rolar todo, até as famosas listas históricas. Eu gostava demais de gravar fitas para ocasiões específicas, principalmente se tinha algum evento especial, como uma balada na chácara de alguém, no pé da Chapada. Nesse caso ir para o lance ouvindo uma fita num roadstar auto-reverse fazia parte do ritual.

Eu não tinha um método determinado e nem reservas quanto a estilos e nacionalidades, simplesmente gravava de acordo com o que vinha na cabeça e no sentimento, e, claro, o que surgia do controle do tempo de cada faixa, as fitas tinham 30 minutos de cada lado, em sua maioria. Gostava de dar nomes às fitas e criava umas capas com colagens ou desenhos. Vou repassar algumas delas, que não tocam mais, mas que são guardadas com muita veneração. Não é saudosismo não, é apenas história bem vivida. Era um tempo voltado para a lisergia, para o cultivo de grandes amizades, para o esporte, para a música, para a leitura e para as descobertas essenciais que guiaram minha vida até aqui. Eis que corriam os anos 70...




Essa aqui se chamava La Beatriz e foi devidamente queimada pelo calor dos cabeçotes:


Lado A

1- Love is the drug – Roxy Music – 4:07
2- Good golly miss Molly – Creedence Cleawater Revival – 2:38
3- No fun – The Stooges- 5:15
4- I’m ready – Freddie King- 3:45
5- Black sheep of the family- The Rainbow – 3:19
6- Shattered – Rolling Stones – 3:47
7- Walkin’ by myself – Johnny Winter – 3:31
8- Trying to get away – Grand Funk – 4:10

Lado B

1- Southern man – Neil Young – 5:34
2- Houses of the holy – Led Zeppelin – 4:01
3- Overnight bag – Rory Gallagher – 4:45
4- I ain’t no superstitious – Jeff Beck Group – 4:55
5- Stop – James Gang – 4:05
6- Lady love – Robin Trower – 3:02
7- Statesboro blues – Allman Brothers Band – 4:34



quarta-feira, 16 de maio de 2012

Rory Gallagher - A Million Miles Away Irish Tour 1974


AOS VIVOS


RORY GALLAGHER – Irish Tour

Existe uma estátua de Rory Gallagher em sua cidade natal, Ballyshannon, como também existe lá um festival anual em sua homenagem. Esse ano o Rory Gallagher Tribute Festival Internacional acontece entre quinta-feira, 31 de maio, e domingo, 03 junho de 2012. Mas, isso ainda é pouco para ilustrar a genialidade desse guitarrista irlandês.




Além de um estilo próprio, o que não é fácil no universo das guitarras, Rory Gallagher tinha uma técnica apurada, sem ser pomposo, sem ser enfadonho, e, principalmente, sem ser um manézão da guitarra, que despeja trezentas escalas por minuto, quatrocentas alavancadas por segundo e ainda arranja tempo para arrumar o cabelo para foto, tirada por outro manézão da plateia, que balança desesperadamente a cabeça para ver se ela pega no tranco.

Irish Tour é uma das maiores obras do rock. É um daqueles discos que você deve ter sempre dois exemplares para prevenir qualquer imprevisto. Esse, de fato, é um disco vivo, e eterno. Irish Tour foi registrado em janeiro de 1974, com gravações escolhidas dos shows: Belfast’s Ulster Hall, Dublin’s Carlton Cinema and Cork’s City Hall. Em plena forma, Rory Gallagher desfila aqui o seu fraseado energético e seu timbre apologético.




São raros os guitarristas que sabem para que serve o botão de volume da guitarra. Também são escassos aqueles guitarristas que sabem explorar todos os timbres de um amplificador valvulado, e sem precisar de uma parafernália de periféricos e microfones customizados e combinações bizarras e processamentos alienígenas de sinais. Apenas guitarra, amplificador e talento. Rory Gallagher é um deles. Um verdadeiro mestre da pegada. Além de tudo isso, a sua apresentação era incendiária e o seu carisma era um verdadeiro show à parte.

A banda é apresentada logo ao fim da primeira música: “Cradle Rock”, do disco “Tattoo”, lançado em 11 de agosto de 1973. Com Rod De’Ath (drums) Lou Martin (keyboards) and Gerry McAvoy (bass), Rory Gallagher apresenta o seu cartão de visitas em grande estilo, com direito a um solo visceral de slide, em sua legendária Fender desbotada. Esse é o início de uma viagem histórica do blues/rock. O que vem depois é puro sentimento de um autêntico band lead.

A segunda faixa é um clássico de Muddy Waters, iniciado só com a guitarra de Rory chorando a crueza do blues, nessa pequena passagem inicial, é possível você perceber a maestria nos timbres cristalinos de Rory Gallagher, que vai fundo nas válvulas e nos captadores, somente, o resto é pegada, velho. Pegada. Isso é o que faz um guitarrista entrar para a história. Com certeza você já escutou vários solos de blues. O dele, em “I Wonder Who” é seminal. Escute e você será contaminado. Em determinado momento é possível ouvir de fundo um chiado, comum em captadores single coil e amplificador valvulado no talo.



“Tattoo’d Lady” é a terceira faixa, também oriunda do disco “Tattoo”. Esse é um rock’n’rrol básico, cru, daqueles que você lembra a melodia quando está trabalhando e lamenta a falta de tempo ideal para curtir o que há de bom na vida. Não tem como você ouvir essa música de forma impassível. Logo em seguida vem “Too Much Alcohol”, do lendário guitarrista de blues americano J. B. Hutto, outro mestre do slide. Clima imperdível. Claro que Rory apresenta seu slide.

“As the Crow Flies” é uma daquelas faixas acústicas tidas como obscuras, mas que de secundárias não têm nada. Essa é uma faixa emocionante. Toda vez que a escuto eu não me conformo com a morte prematura desse cara. Sacanagem, tanto político calhorda que já devia ter os olhos comidos pelos urubus... “A Million Miles Away” começa com o verdadeiro timbre da Fender, com harmônicos flamejantes e solo inspirado demais.

Também do disco “Tattoo”. Essa é uma balada daquelas históricas. A metáfora de vento e vela é propícia demais para essa faixa. Aqui é possível entender o que esse guitarrista tem de muito especial, o solo explorando o volume da guitarra não é pra qualquer um. É uma faixa que tem uma melancolia inevitável, pela letra, pela melodia e pelas dinâmicas da banda. Estou escrevendo agora profundamente emocionado, ele está à milhas de distância, indo, e eu também. Vou parar por aqui...

Escute o disco todo e não perca a oportunidade de visitar a página oficial desse mestre, que é magistral, com muita informação e muito material histórico: http://www.rorygallagher.com/






terça-feira, 8 de maio de 2012


CLÁSSICOS



ÁGUIA NÃO COME MOSCA – Azymuth
Instrumental brasileiro nas alturas

Esse é o segundo disco da banda brasileira de jazz fusion, lançado em 1977, no auge desse gênero, com grandes nomes lançando discos excepcionais por toda a década de 70 e início da década de 80. Os rótulos se multiplicavam na mídia especializada, assim como as críticas favoráveis e desfavoráveis. Os brasileiros não só estavam inseridos nesse cenário, como também já eram muito respeitados pela habilidade harmônica, pela inventividade e pelo exímio domínio da linguagem instrumental.

Enquanto parte da crítica internacional torcia o nariz para as misturas, nomes como Azymuth, Oregon, Egberto Gismonti, Wayne Shorter, Raul de Souza, Airto Moreira, Gato Barbieri, Caldera, Shakti, entre outros, misturavam o jazz com culturas diversas e se alinhavam a outros que misturavam o jazz com o rock, o funk, o sol e o blues, tais como Weather Report, Stanley Clarke, Larry Coryell, James Blood Ulmer, Mahavishnu Orchestra, L.A. Express, Passaport, Pat Martino, Chick Corea, e vários outros,  lançavam uma obra prima atrás da outra, independente do que os puristas pensavam, ou pensam, tanto faz.

Ouvir “Águia não Come Mosca” não é voltar no tempo, nem muito menos destilar um saudosismo inoportuno de como a década de 70 era mágica, mas sim, confirmar o fôlego criativo de uma banda que está na ativa até hoje. Falo de excelência, não falo de caretice burocrática e cerebral de um Wynton Marsalis desses, saído de uma escola quartel qualquer, movido a purismo flatulento e mecanicismo instrumental, que resulta em uma máquina de reproduzir escalas em alta velocidade. Falo de manha, falo de suingue, falo de criatividade com virtuosismo pleno.


O trio José Roberto Bertrami, Alex Malheiros e Ivan Conti, respectivamente: teclados, baixo e bateria, antes de formarem a banda Azymuth, já tinha em seu currículo uma série de participações em discos de artistas importantes do cenário da música brasileira. Nesse sentido vale a pena conferir a sonoridade espetacular de discos como “Eu quero é botar o meu bloco na rua”, de Sérgio Sampaio, e “Alucinação”, de Belchior. Os timbres de piano fender com chorus, baixo fretless e bateria encorpada, mais para o rock do que para o jazz, fizeram a ambiência de muitas viagens sonoras.

Eu sempre achei o som dessa banda muito especial, com capacidade total de hipnotizar qualquer um, com força suficiente para chapar. Assim que comprei o LP, passei a pancada sonora para uma fita cassete cromo, tdk, e fomos ouvir subindo a serra, em busca do Serrano, um clube campestre aqui do Crato, no famoso Corcel I, marrom, do meu amigo Boris. Desde esse dia célebre, foram inúmeras viagens e mais viagens na companhia de Azymuth, de Boris, de Etym e de Cândido Filho. Em pleno 1977.

A primeira faixa é uma singela melodia, viajandona que só: Vôo sobre o horizonte, depois disso, até à faixa 10, é puro suingue brasileiro, misturando samba, bossa, afro, jazz, funk e mpb. Essa é uma das cozinhas mais perfeitas do instrumental brasileiro, uma mistura de pegada visceral e sutileza, com muita síncope e explorações de tempos fracos e contratempos, em texturas rítmicas embriagantes. Destaques para “Águia não come mosca”, “Tarde”, “Despertar”, “Tamborim, cuíca, ganzá, berimbau”,  “A presa” e “A caça”. A sonoridade da banda nessa produção lembra os timbres de teclados de Herbie Hancock e The Jeff Lorber Fusion, com levadas funk.

A mistura de samba fica por conta da adição de Ariovaldo, Nenem, Doutor e Jorginho, na percussão brasileira, que tem o seu apogeu na última faixa: “Águia negra x Dragão negro”, com a adição de uma torcida vibrando em plena vibração no Maracanã. A gravação analógica deixa essa obra prima com uma sonoridade única e intransferível.

domingo, 6 de maio de 2012

Clássicos





Que disco é esse, cara!!!???


Eu poderia comentar qualquer disco desse maluco, com ou sem Crazy Horse, que caberia numa boa. Neil Young é dono de uma discografia monumental. Esse é um artista extremamente significativo para qualquer uma geração que goste de música de boa qualidade. Mas o fato é que eu tenho uma relação toda especial com essa pedrada chamada Sleep With Angels. 1994 foi um ano em que fui acometido de uma melancolia muito pesada, que durou aí um bom tempo, foi a música e a leitura que me salvaram, pois eu não me interessa por mais nada além disso.

Há quem diga que essa foi uma busca de Neil Young em reviver velhos tempos com seus companheiros de viagem, responsáveis por momentos iluminadamente chapantes, como todos os seus álbuns da década de 70. Se foi isso mesmo ou não, a verdade é que Sleep With Angels tem baladas com violões mágicos, guitarras distorcidas, climas espaciais com solos inspirados e a pegada crua da banda Crazy Horse, esse disco é uma espécie de travessia de um deserto a bordo de um balão entre o final da tarde e o anoitecer .

Esse disco é também conhecido pela ligação direta de Neil Young com a carta de despedida de Kurt Cobain, em que um verso da música Hey Hey, My My (into the Black) é citado: “It's better to burn out than to fade away - É melhor queimar do que se apagar aos poucos”. A música sleep with angels é dedicada a Kurt e tem letra e timbragem que ondulam entre o soturno e o delicado. Essa música acaba de uma vez, deixando suspenso no ar o prematuro de um fim inaceitável.

Logo depois dessa música vem uma das baladas mais bonitas desse canadense mestre dos timbres valvulados, escute “Western Hero” de frente para um pé de serra, de preferência aqui no Cariri, de frente para Chapada do Araripe, que você terá uma experiência transcendental. Pois logo depois de ”Western Hero” vem “Change Your Mind”, o que é garantia total de um vôo pleno, por sobre mares, montanhas, rios e natureza humana, além dos desertos, é claro. O solo de Neil Young nessa música é uma ligação única com os arquétipos da guitarra, não é fritura, não é virtuose, não é técnica apurada, é apenas o verdadeiro espírito do rock dançando sobre o tempo, se deixando levar pela inspiração.

Feche os olhos e reflita sobre os dias atuais, sobre o cotidiano, sobre as coisas simples, e sinta por sobre os seus ombros os dias que se passam descontinuamente, e que de forma fragmentada marcam a sua passagem pela vida, bem como determinam suas ligações eternas com os vivos e os mortos. No fundo eles são as mesmas pessoas, todos nós carregamos nossos cadáveres em forma de unhas, cabelos, cílios, esperanças e metamorfoses. Se você trilhar sobre esse viés, você estará bem próximo da essência desse disco insubstituível, intransferível, inesquecível.

Se você escutou as faixas citadas aqui e ainda não se convenceu, escute então a próxima: “Blue Eden” e mergulhe na atmosfera mágica do blues elétrico em pessoa, forte, agressivo e desesperadamente inquieto. Aqui a guitarra lamenta existir apenas uma vez de cada vez. Pena é que ela é rápida demais. Não a guitarra, mas a música. Ainda bem que a viagem de Sleep With Angels não termina aí. Logo em seguida vem a líquida e vaporosa “Safeway Cart”, abordando a falta de perspectiva daqueles que nascem nos guetos. Música singela e dura.

Não comentei nem o início e nem o final do disco, que é pra você descobrir com quantas viagens se faz um disco de Neil Young. Esse é o vigésimo segundo disco dele e o sexto com a Crazy Horse. Esse é o tipo de disco que a gente tem que guardar na alma, que é para escutar na hora que bem entender.