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segunda-feira, 9 de julho de 2012

VELA ABERTA - WALTER FRANCO

Walter Franco-Canalha(ao vivo Festival da TV Tupi,1979)ver1 (only audio)



OBSCUROS


VELA ABERTA – Walter Franco

Ouvir Walter Franco cantando “Vela Aberta” faz bem para o espírito, renova a esperança, promove uma doce revolução na espera por algo que complemente a existência. Ele convida: tire os pés do chão / vamos passear / longe da razão / sem pressa pra voltar. A vertigem é a sensação essencial da vida. Se perder e se achar é apenas uma questão de ousadia, reservada só para os especiais, para os especialistas em cumplicidades especializadas.

Por muito tempo Walter Franco foi chamado de maldito. Sobre seus ombros foi jogada a capa de vanguardista. Sua música foi tachada de difícil. Assim, por muito tempo Walter Franco é escutado por poucos. Sua discografia não é grande, mas a sua reputação é enorme entre aqueles que buscam qualidade e honestidade no universo musical brasileiro, repleto de almas sebosas, de oportunistas, de farsantes, de estercos flutuantes.


De fato você encontra traços do minimalismo, da psicodelia, da poesia concreta, do ludismo, da sabedoria perene, do haicai, da contracultura, do non sense, do rock, do pop, da MPB, do experimentalismo linguístico e do tratamento de mixagens em sua arte. Mas esse é o grau natural de informação de uma pessoa culta, plausivelmente urbana, ativa e receptiva do seu tempo. É justamente esse aspecto que fundamenta a diferença entre arte e artemanha. Já dizia o filósofo Raul: falta cultura pra se cuspir na estrutura.

“Vela Aberta” é o quarto disco de Walter Franco, se não for computado o compacto simples “Tema do hospital”. A canção "No Fundo do Poço" foi tema da novela "O Hospital" da Rede Tupi no ano de 1971. A outra música é “Tire os pés do chão”. Com uma discografia pequena, apenas na quantidade, Walter Franco protagonizou algumas cenas bizarras da música popular brasileira, antes de chegar ao seu quarto disco. A vaia recebida por ele, ao defender a música “Cabeça”, em 1972, no Festival Internacional da Canção, da Rede Globo, é um desses casos.

Quando o júri formado por Nara Leão, Roberto Freire, Rogério Duprat, Júlio Medaglia e Décio Pignatari, deu o primeiro lugar para Walter Franco, a casa veio a baixo, a música tinha sido intensamente vaiada, o público não entendeu absolutamente nada, e nem a Rede Globo assumiria esse pacote, uma vez estando ela compromissada com a mediocridade. Resultado o júri foi deposto e como consequência, Roberto Freire e a banda Pholhas, denunciaram a armação, que sempre aconteceu nesses famosos festivais da mídia brasileira. Ele foi preso e ficou por isso mesmo.

“Vela Aberta” segue a trilha aberta por “Respire Fundo”, disco anterior, de 1978, com a mesma sonoridade, grandes músicos, produção apurada e leveza discursiva, e também lançado pela Epic. O repertório traz algumas releituras: “Me deixe mudo”, lançada no famoso disco “da mosca”, mais conhecido como “Ou não”, de 1973; “Feito gente”, lançada no disco “Revolver”, de 1975; e mais “Tire os pés do chão”, lançada no compacto simples “Tema do hospital”, de 1971.


A música “Canalha” rendeu mais uma controvérsia a Walter Franco, quando da sua apresentação no “Festival da TV Tupi”, em 1979, com discurso inflamado de Ziraldo, o então apresentador. Eram os anos de chumbo da ditadura militar. Walter Franco alegava que canalha era apenas a dor de existir. Acontece que devido ao momento histórico não tem como desvencilhar a música das imagens de tortura, extermínio e canalhice dos militares no poder. O arranjo de “Canalha” é pesado, agressivo e áspero, como condiz a letra.

“Vela Aberta”, faixa de abertura, é singela, mística e de uma leveza singular. Essa é uma das mais inspiradas músicas brasileiras. Sérgio Hinds, do “Terço”, cria um clima etéreo com a sua guitarra chorada, expressiva. Viagem certa. É pra ser escutada na criação de momentos de paz. “O dia do Criador” segue na caminhada mística. É uma espécie de reggae suingado, através do qual Walter Franco propaga suas convicções espirituais.


“Canalha” é a terceira faixa do disco, com peso na medida certa, combinando com um arranjo de cordas certeiro, contrastando com as viradas viscerais de bateria e voz rasgada de Walter Franco. Rara e abismática. “Corpo Luminoso” é outro suingue magistral, em cima de um poema minimalista. “Divindade” recebe nova roupagem, como também “Tire os pés do chão”, ambas mantêm a linha mística.

“Como tem passado” é uma espécie de charleston misturado com fox, e tem ludismo e non sense, com arranjo de metais na frente. Excelente arranjo. “Feito Gente” também recebe nova roupagem, bem diferente da original, com direito a arranjo de cordas e de metais proeminentes, bem ao estilo difundido nos anos 80, com influências diretas do Earth Wind and Fire. “Me deixe Mudo” recebeu a roupagem influenciada pelo reggae, na tradução devida da “Cor do Som” e de “Pepeu Gomes”, ficou massa, simpática e mais próxima do público.

“Bicho de Pelúcia” é uma parceria com Sérgio Pinto de Almeida, introspectiva e irônica, com arranjos de cordas, mais próxima dos experimentalismos anteriores do autor. “O blues é azul” é uma espécie de r&b, bem humorado e lúdico, pra terminar o disco de forma descontraída, também com arranjo de metais, deixando espaço na frente para os vocais femininos.



Os malucos zen:

Arranjos: Eduardo Assad

Eduardo Assad - teclados
Luiz Guilherme Rabello – bateria
Pedro Ivo Lunardi - baixo elétrico
Bira da Silva - percussão
Elias Almeida - guitarra
Luiz Guilherme Rabello - percussão
Sérgio Hinds - guitarra
Alwin E. J. Oelsner - viola de arco
Caetano Domingos Finelli - violino
Clemente Capella - violino
Elias Almeida - viola, violão
Elias Slon - violinoFlávio
Antônio Russo - violoncelo
German Wajnrot - violino
Joel Tavares - violino
Jorge Salim Filho - violino
Loriano Rabarchi - violino
Luiz Alfonsi - violino
Perez Dworecki - viola de Arco
Shinji Ueda - violoncelo
Settimo Paioletti - trompete
Severino Gomes da Silva - trombone
Arlindo Bonadio - trombone
Geraldo Auriani (Felpudo) – trompete



Discografia

Tema do Hospital – compacto simples (1971)
Ou Não (1973)
Revolver (1975)
Respire Fundo (1978)
Vela Aberta (1979)
Walter Franco (1982)
Tutano (2001)

Acompanhe Walter Franco no Twitter

Walter Franco @walterfranco Aqui quem fala é meu Walter Ego. São Paulo, Brazil

sábado, 7 de julho de 2012



OBSCUROS


CHUNGA’S REVENGE – Frank Zappa

Esse é um disco de transição do maior gênio louco da história do rock. Esse disco inicia a vertente dos anos setenta na carreira de Zappa. Dá uma espécie de parada no discurso político-satírico e aborda temas como sexo e experiências diversas na vida de uma banda na estrada. O sexo sempre foi um tema controverso na carreira desse pirado. Mas não é só isso que tem esse disco não.

A crítica nunca entendeu direito a figura multicriativa de Zappa. Muitos ignoram suas experiências e outros esperam sempre genialidades mirabolantes em seus discos, e poucos conseguem acompanhar as ideias desse pai da mãe das invenções. “Chunga’s Revenge”, por exemplo, é uma mistura de rock; jazz; blues; música de vanguarda; pop; doo wop; boogie; e ironias diversas. Mas não é nada disso individualmente ou integralmente.

A crítica não recebeu bem esse disco. Boa parte dos incapacitados alegou que faltava unidade. Outra parte afirmou que era pop demais, que a banda era sem liga e que Zappa tava mais interessado em ganhar dinheiro. O fato é que Zappa produzia muito e gravava tudo que criava, em estúdio e ao vivo, com músicos diversos. Quem é zappeiro de verdade identifica todas as suas fases e todas as suas facetas. Nesse sentido esse disco tem algumas peculiaridades.


A estética de vanguarda e instrumental vem do período de “Hot Rats”; “Lumpy Grave”; “Burnt Weeny Sandwich” e “Uncle Meat”, gravados anteriormente, em 68, 69 e 70. A parte blues, roqueira e maníaca por sexo, estava em processo, com “Chunga’s Revenge”, lançado em 70, e “200 Motels”, lançado em 71. As formações variam de acordo com essas fases. O que não varia de forma nenhuma é a qualidade musical e a ousadia em experimentar. “Chunga’s Revenge” também marca a estréia nos vocais de Mark Volman e Howard Kaylan, os famosos Flo e Eddie, ex-integrantes da banda “Turtles”, banda pop psicodélica americana, que emplacou vários sucessos, entre eles o hit “happy together”.

"Transylvania Boogie" começa o disco com a presença de uma guitarra com timbre marcado pelo excêntrico uso do wah, assim começa a intensa aula de timbres de Zappa nesse disco. Uma viagem pelo mundo freak. Logo em seguida vem a irônica "Road Ladies" , com Flo e Eddie nos vocais e solos de guitarra na cara, mais uma vez o wah timbra inusitadamente a guitarra de Zappa. "Twenty Small Cigars" é uma incursão pelo jazz bizarro apresentado em “Hot Rats”, clima introspectivo e enigmático. O timbre de Zappa nessa faixa é qualquer coisa absurdamente diferente. Não é uma faixa para qualquer um.


"The Nancy & Mary Music" é intensamente experimental, com uma improvisação de percussão exótica e mais viagens de wah na guitarra, essa faixa foi gravada ao vivo em Minneapolis, no teatro Tyrone Guthrie, imagine o resto desse show como foi loucura. "Tell Me You Love Me" e "Would You Go All the Way?", em seguida, formam, para os padrões zappistas, uma parte do material pop do disco e apresentam arranjos divertidos e complexos ao mesmo tempo, se o mundo pop fosse assim seria bom demais. Escute a guitarra nessas duas músicas e perceba as linhas de vocais e você vai entender o que é pop para esse pinel.

"Chunga's Revenge", a faixa titula é digna da excentricidade musical, típica de Frank Zappa, com direito a wah no sax Ian Underwood, imperdível. "The Clap" é mais um experimento estranho de percussão. O disco fecha com mais dois pops descabelados: "Rudy Wants to Buy Yez a Drink" e "Sharleena", dois arranjos desmiolados, irônicos, satíricos, com linhas de vocais completamente debochados. A última faixa é simplesmente uma pérola do repertório zappiano, um verdadeiro clássico, demais, demais.

A relação dos doidos:

• Frank Zappa – guitar, harpsichord, percussions, drums, vocals
• Max Bennett – bass
• George Duke – organ, trombone, electric piano, sound effects, vocals
• Aynsley Dunbar – drums, tambourine
• John Guerin – drums (only on Twenty Small Cigars)
• Don "Sugarcane" Harris – electric violin, organ
• Howard Kaylan – vocals
• Mark Volman – vocals
• Jeff Simmons – bass, vocals
• Ian Underwood – organ, guitar, piano, rhythm guitar, electric piano, alto saxophone, tenor saxophone, pipe organ







terça-feira, 3 de julho de 2012

Stone Gossard - Fits (Bayleaf, 2001)




PRA LIGAR

BAYLEAF – Stone Gossard


Projeto paralelo. Disco alternativo. Produção independente. Seja lá qual for o rótulo dado a esse cd, é completamente desnecessário, ao mesmo tempo em que inoportuno. Esse é um trabalho criativo, na mais plena aplicação do termo. Além do talento e da veia roqueira, existe nesse álbum a antena do tempo, da atualidade, dos caminhos herdados, dos desdobramentos do rock.

Não importa o ano de lançamento e nem a origem de Stone Gossard, mesmo se ele não tivesse entrado na pleura do rock através dos ares pesados do Pearl Jam, como membro fundador, ainda assim ele teria o seu lugar reservado no bólido da resistência cultural que levará os últimos resquícios da arte para os confins do universo. Onde tudo é mercado, onde tudo é grife e quase nada é blefe, “Bayleaf” é um verdadeiro condimento para transformar os dias amargos.

Esse disco levou quase cinco anos para ficar pronto e foi lançado em 11 de setembro de 2001. Uma das suas características é a maturidade. A maturação é um fenômeno em extinção em tempos de fragmentação e descontinuidade. Por isso muitos não especificarão de imediato, e nem especificaram, o valor dessa obra. Não existe nada de fenomenal em “Bayleaf”, e esse é o seu maior segredo. É música simples, direta e honesta, com produção impecável, de quem sabe o que faz na captura dos sons.

Escute a balada “Anchors” e você compreenderá de imediato o que estou escrevendo. Essa é uma daquelas faixas feitas para você ouvir no fone de ouvido, debruçado na janela do vigésimo andar, olhando a cidade lá embaixo anoitecer sob um manto fino de garoa. Você embarcará numa cama de texturas de órgão hammond c-3, piano e violão acústico, e viajará em busca do destino dos carros, e sentirá dificuldades para voltar para o mesmo lugar.

A etérea “Fits” será responsável por divagações, por digressões e oscilações leves do espírito. Essa faixa parece um mantra saído do ano 200, antes de Cristo. Quando você menos esperar os seus pés já saíram do chão. Uma guitarra com envelope filter dará um clima especial a esse momento. Uma outra guitarra distorcida e absurdamente bem timbrada, será a sua âncora em ecos. Aproveite e visite aqueles lugares obscuros da sua mente e limpe o quarto, abra as janelas e dê uma arejada na varanda.

“Bore Me” é a primeira faixa do disco. Ela contém o DNA da pegada das outras músicas. Tem texturas leves e guitarras distorcidas. E como em todo o disco, com uma timbragem eficiente em demasia, eis o extremo bom gosto do guitarrista. Nessa faixa você é apresentado ao vocalista Stone Gossard, que despretensiosamente toma a cena e proporciona momentos convincentes de pura leveza.



Em “Pigeon” você vai ouvir uma guitarra timbrada com fuzz que o carregará para territórios mais pesados. Nessa faixa Stone Gossard faz um solo muito bem colocado, sem aquela ansiedade de fritar, que é típica dos guitarristas que lançam trabalhos solos. Essa é uma faixa mais densa, com pegada mais forte. No entanto, as texturas e o toque de leveza não desaparecem.

A faixa que dá título ao disco tem o espírito de Neil Young perambulando pelas esquinas. Guitarras distorcidas e aquela pegada quase épica, intensa, com baixo e bateria, tocados por Stone Gossard, seguindo a linha característica do Crazy Horse. Stone Gossard usa na faixa, com economia e funcionalidade, um wah wah e um rotovibe, provando a sua especialidade em criar camadas sonoras.

As outras faixas você vai descobrir as especiarias e o tempero ouvindo inteiramente esse disco sensacional. Stone Gossard tocou guitarras, violões, piano, baixo, bateria e percussões, além dos vocais. Ele contou com a ajuda dos pirados: Pete Droge – background vocals, 12-string guitar, Prophet 5, slide guitar, clavinet, mellotron, guitar, bass guitar, keyboards, acoustic guitar, production; Mike Stone – drums; Ron Weinstein – piano, Hammond C3; Ty Willman – lead vocals on "Cadillac", "Unhand Me", and "Fend It Off", background vocals, entre outros.